Conheça o significado da música Não Enche, de Caetano Veloso

Não Enche, música de Caetano Veloso, tem uma letra bastante curiosa e são muitas as especulações a respeito do seu significado. 

Embora só entrando na mente do artista para saber a sua real motivação, o interessante de uma obra é exatamente essa liberdade interpretativa.

Cada fã faz a sua própria análise através de uma perspectiva e as discussões a respeito tornam tudo ainda mais vivo. Não deixa de ser uma forma de participar e enriquecer ainda mais a canção. E com Caetano nada vem mastigado.

Não Enche está presente no álbum Livro, lançado em 1997, e se você ficou curioso para conhecer o seu significado, que tal vir analisar com a gente?

Não Enche: o significado da música de Caetano Veloso

Uma letra destilando raiva a uma mulher? Uma crítica à mídia? Uma resposta a música Como Eu Quero, do Kid Abelha… ou nenhuma das alternativas? Certamente a última opção possa ser a mais coerente, principalmente em se tratando de Caetano.

Desde que foi lançada em 1997 no álbum Livro, Não Enche ganhou muitas especulações sobre o que o cantor estaria se referindo na letra.

O que não se pode negar é que o personagem da canção está em um dia de ira. Sua paciência se esgotou e ele decidiu extrapolar, colocando pra fora toda a sua indignação.

O responsável pela revolta do personagem é colocado no feminino; é alguém que está impedindo o sujeito de viver à sua maneira. Caetano teria dito, certa vez, que todas as suas composições são autobiográficas.

Dentro de um contexto geral, e até mesmo para quem pretende se apropriar da música para extravasar em um momento particular, depois de uma briga de casal, por exemplo, ela pode servir e até ajudar bastante. Mas vamos analisar melhor alguns versos. 

Análise dos versos de Não Enche

Me larga, não enche
Você não entende nada
E eu não vou te fazer entender
Me encara, de frente
É que você nunca quis ver
Não vai querer, nem vai ver

Durante uma entrevista para a Folha, em novembro de 1997, para falar sobre o lançamento de Livro, questionado se o disco era conservador por misturar axé music e orquestra, o músico respondeu ser um rebelde. 

E emendou: se parece conservador deve ser porque sou rebelde demais. Parece conservador para vocês que se fingem de rebeldes.

Percebemos no verso inicial o indivíduo expondo toda a sua raiva. É alguém ou algo que o incomoda, que não lhe compreende, mas também ele não está disposto a explicar. Se alguém não te percebe, por que gastar energia tentando mudar isso?

Meu lado, meu jeito
O que eu herdei de minha gente
Eu nunca posso perder
Me larga, não enche
Me deixa viver, me deixa viver
Me deixa viver, me deixa viver

Fazendo referência à sua terra natal, a Bahia, Caetano tenta explicar que esse seu jeito foi herdado do seu povo. Ele é assim e nunca vai perder essa essência. 

Quando observamos o videoclipe de Não Enche, conseguimos ter outras perspectivas interessantes que ajudam a entender. Caetano está sozinho deitado na cama, folheando uma revista, como se estivesse entediado. 

As paredes e o chão do quarto são vermelhas, transmitindo energia de raiva, ira… Alguém entra no ambiente e ele começa a interagir com a câmera, como se fosse a pessoa em questão. Isso faz parecer que a revolta é com o público, com quem está do outro lado assistindo.

Cuidado, oxente!
Está no meu querer
Poder fazer você desabar
Do salto, nem tente
Manter as coisas como estão
Porque não dá, não vai dá

Ele vai se despindo, ficando mais leve, como quem se livra de um fardo. Está em busca do seu direito de ser único, nem que para isso precise fazer o outro descer do salto. 

Quadrada! Demente!
A melodia do meu samba
Põe você no lugar
Me larga, não enche
Me deixa cantar, me deixa cantar
Me deixa cantar, me deixa cantar

Este é o primeiro verso com a presença de alguns xingamentos no feminino, o que fez algumas pessoas interpretarem como uma música machista. 

Apesar disso, esse é o verso que mais se afina com a ideia de que a letra é um recado para a imprensa, que sempre se comportou de um jeito meio quadrado mesmo. 

A baianidade de Caetano e a percussão da canção, dando mais energia à música, coloca o outro no lugar que lhe convém. 

Música para todas as mulheres dominadoras 

A esposa de Caetano, Paula Lavigne, deu uma entrevista para a Folha em março de 1998 e disse que o marido havia feito Não Enche para todas as mulheres dominadoras, para que elas pudessem se libertar dessa versão. 

Há uma versão um tanto louca e doentia que muitas mulheres podem carregar dentro de si.

Porém, é preciso refletir, a mulher é dominadora e neurótica, ou é a sociedade machista e o comportamento tóxico dos homens que a tornam assim? Já passou da hora de parar de culpabilizar as mulheres, não é?

E se Caetano estiver falando com seu eu limitador?

Eu vou
Clarificar a minha voz
Gritando
Nada mais de nós!
Mando meu bando anunciar
Vou me livrar de você

Repare neste verso e ele pode nos levar a outra interpretação. Veja como a obra de Caetano é múltipla. Ele diz que vai clarificar sua voz, ou seja, tornar mais transparente, mais verdadeira.

Seria um embate do personagem com o seu ego? O seu eu mais limitador que vive enchendo o saco, super medroso e dominador? Ele tem uma sabedoria de rapina, como diz um dos versos, rouba nossa essência, essa sim, sábia. 

Como sanguessuga, rouba nossa energia e nos limita demais, até da gente manifestar o nosso lado criativo. 

Enfim, são muitas as possibilidades de interpretação, mas o que fica muito claro é que Não Enche é uma música sobre um sujeito em busca de libertação.

Ele quer o direito de gozar, de começar uma nova história e de viver dez, cem, mil… sem ninguém que o limite, nem ele mesmo. Ele quer viver na luz: 

Eu vou viver sem você
Na luz desse dia “D”
Eu vou viver sem você

10 músicas para celebrar a carreira de Caetano Veloso

Não vai embora sem deixar a sua opinião não, viu! Conta pra gente nos comentários qual é a sua interpretação do significado de Não Enche, de Caetano Veloso?

Como o cantor é incrível, separamos 10 músicas para celebrar a carreira de Caetano Veloso, que é um dos maiores nomes da MPB.  

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